quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Esquina

Atravessei a rua e segui adiante.
Não dava mais para olhar para trás.
Na mesma velocidade em que o norte me chamou, veio o leste e mudou o cenário.
Quando parei para pensar, e ver, não estava mais lá. Restou apenas a sombra do último passo antes de sumir por entre os prédios.
Dinâmica, esta realidade.
Dinâmica e dura.
Na incerteza da busca, perdida entre passado e futuro, o presente sofre com a ausência.
Vácuo entre o outrora deslocado e o imponderável por vir.
A angústia antes do sono agora se espalha por entre meus dedos, contaminando tudo o que toco.
Desperto e disperso.
Acordado em desacordo.

Sigo adiante. Uma avenida se avizinha em minha vista.
Mais uma dura esquina a se cruzar.
Encruzilhada entre dois caminhos levemente opostos e igualmente satisfatórios.
A dor da perda é certa. Talvez a da vitória, também.
O conforto desolador de olhar para trás e se arrepender tá logo alí.
A ilusão do controle e de alguma previsibilidade, também.
Estarei eu no comando?
Sem certeza na escolha, certo mesmo é ter de escolher.

Adiante, além da esquina, nos dois lados deste cruzamento, há de tudo o que não posso enxergar com os olhos.
Deixo o coração como guia e atravesso o pavimento.
A cada passo, o presente se dilui na quilometragem e o passado vira a presença pesada e pesarosa do que não houve ou não haverá mais.
Sempre vai ser assim.
Sempre.
Parece fácil, parece difícil, mas é apenas uma constatação lógica:
as inevitáveis escolhas nos levam e deixam o rastro da destruição.
Darwinismo ou destino?
Depende de onde se posiciona o espectador.
Na lente do fotógrafo, um frame transitório, perdido no espaço-tempo.
Nas letras, o devaneio ansioso e redundante de quem não quer escolher, mas sabe que, parado, não vai dar para ficar.
E vai atravessar para um dos lados.

E lá na frente, o que este novo caminho me reserva?

Nada além de duas ruas com uma esquina no meio...

Um comentário:

  1. Essa é aquela esquina que cruza as ruas vida e sonho ou a que cruza o certo e o errado? O problema é ter que escolher quando o meio termo já nos basta.

    Adorei o texto!

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