quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Finito


...e então, ele parou diante do espelho.
Olhou fundo em seus olhos.
Uma sensação de tristeza, uma leveza melancólica.
Cada detalhe começou a gritar.
A olheira, cuspindo noites mal dormidas.
Manchas de verões e furacões, de sol e de chuva.
Rugas de causos e causas diversas.
Prós e contras do advento adverso da vida.
Vida que fere e é ferida.
E graças à Deus, não cicatriza.

Se não há dor nem ausência, nunca houve presença.
Nunca houve o amor.
Nunca haverá a saudade.

Ele pensou, então, em seu bolso furado.
Tostões ricos em histórias.
Aventuras de hoje, perrengues de outrora.
Patrimonio simbólico da aristocracia factual da memória.
Da cabeça que distorce e, romântica, se embriaga.
E vê o que não houve.
Pra bem ou pro mal.

Não faz mal.
Viveu-se.
Em cada marca do tempo.
A barriga existe, cheia de si e de tanta coisa.
Não se é tão jovem.
Falta menos do que faltava. Tende a piorar.

Podia ser trágico, ou cômico.
Mas não é.
É a beleza de tudo que é finito.
Nunca será pleno.
Completo.
E, por aí, poderia ter sido sempre mais.
Conflito sem fim com o final.

Portanto, ele continuou olhando.
Percebeu que este momento não passou de um segundo.
Horas, dias em sua cabeça.
Anos em sua carne.
Breves instantes de reflexão.

Percebeu.

Finitude é algo que se aceita.
O possível e o impossível se distanciam apenas pelos fatos.
Azar dos fatos.
Ele quer o novo.
Mesmo velho.
Mesmo de novo.

Abriu um sorriso e deixou o espelho.
E o espelho e tudo o que ele viu em um segundo foi consigo.
Seguiu caminhando.
Para onde, não sei. Nem ele.

Mas ele vai chegar.

Ah, se vai...